
Numa altura em que mais de 2,2 mil milhões de pessoas em todo o mundo não têm acesso a água potável, uma equipa de engenheiros do Massachusetts Institute of Technology (MIT) desenvolveu uma solução que parece saída da ficção científica: um dispositivo que extrai água potável diretamente da atmosfera, de forma totalmente passiva e sem necessidade de qualquer fonte de energia.
Este sistema inovador foi pensado para as regiões mais áridas do planeta, onde a água é um recurso extremamente escasso e as fontes tradicionais, como rios ou lagos, são inexistentes ou pouco fiáveis. Só nos Estados Unidos, por exemplo, 46 milhões de pessoas vivem em situação de insegurança hídrica.
Como funciona esta "janela mágica"?
O dispositivo, batizado de Atmospheric Water Harvesting Window (AWHW), ou Janela de Recolha de Água Atmosférica, consiste num painel com um hidrogel único que visualmente se assemelha a plástico-bolha preto. Estas "bolhas" em forma de cúpula são especialistas em absorver o vapor de água presente no ar, otimizando a recolha durante a noite, quando os níveis de humidade são mais elevados.
Durante o dia, a magia acontece. A luz solar aquece o painel, fazendo com que o vapor de água capturado no interior se evapore. Esse vapor entra em contacto com uma superfície de vidro, condensa e, em seguida, escorre por um tubo sob a forma de água pura e potável. Todo o processo é autónomo e não depende de baterias, painéis solares ou qualquer ligação à rede elétrica.
Resultados promissores até no deserto
Para testar a sua eficácia em condições extremas, a equipa instalou um painel de um metro quadrado no Vale da Morte, na Califórnia, um dos locais mais secos da América do Norte. Mesmo com níveis de humidade tão baixos como 21%, o dispositivo conseguiu produzir entre 57 e 161,5 mililitros de água por dia, um volume superior ao de outros sistemas passivos semelhantes.
"Construímos um dispositivo à escala de um metro que esperamos implementar em regiões com recursos limitados, onde até uma célula solar não é muito acessível", afirmou Xuanhe Zhao, professor no MIT. "É um teste de viabilidade para escalar esta tecnologia. Agora, é possível construir painéis ainda maiores ou em paralelo para fornecer água potável e alcançar um impacto real."
Segurança em primeiro lugar: água pura e sem contaminantes
Um dos grandes desafios dos hidrogéis deste tipo é a utilização de sais, como o cloreto de lítio, para maximizar a absorção de vapor. No entanto, estes sais podem infiltrar-se na água recolhida, tornando-a imprópria para consumo. A equipa do MIT contornou este problema de forma inteligente, misturando glicerol no hidrogel. Este composto ajuda a reter o sal dentro do gel.
Nos testes, a concentração de iões de lítio na água recolhida foi inferior a 0,06 partes por milhão (ppm), um valor substancialmente abaixo do limite de segurança estabelecido. Além disso, o design em cúpula do hidrogel aumenta a área de superfície para uma maior recolha de vapor, enquanto uma película de polímero no vidro exterior ajuda a arrefecê-lo, facilitando a condensação.
O futuro da recolha de água atmosférica
Os investigadores, cujo estudo foi publicado na revista Nature Water, acreditam que o dispositivo poderá durar pelo menos um ano e mostra-se uma solução promissora para fornecer água segura e sustentável em locais com climas adversos.
"Este é apenas um design de prova de conceito, e há muitas coisas que podemos otimizar", explicou o autor principal, Chang Liu. A equipa já está a trabalhar numa nova geração do material e acredita que um conjunto de painéis verticais poderá, um dia, abastecer residências individuais, especialmente em locais remotos ou fora da rede.