1. TugaTech » Internet e Redes » Noticias da Internet e Mercados
  Login     Registar    |                      
Siga-nos

Jovens a captarem uma selfie com um cão

 

A máxima "se algo é grátis, tu és o produto" nunca foi tão relevante como na era digital atual. O modelo freemium de aplicações e redes sociais solidificou esta ideia, dando origem ao que se designa por "capitalismo de vigilância", um sistema onde os nossos dados pessoais são a moeda de troca.

 

Engenheiros de software perceberam rapidamente que os anunciantes estavam dispostos a pagar valores substanciais pelos dados gerados enquanto navegamos na internet. Esta informação permite às empresas de publicidade "compreender o seu público" e "entregar conteúdo altamente relevante", alimentando um comércio global de dados que cresce à medida que passamos mais tempo online.

 

O negócio bilionário dos dados pessoais

 

Plataformas como Google, YouTube e TikTok baseiam grande parte do seu modelo de negócio nesta troca de dados. Em 2022, a indústria de dados gerou receitas superiores a 274 mil milhões de dólares. As previsões apontam para um crescimento exponencial, esperando-se que atinja perto de 700 biliões de dólares até 2030.

 

Com a expansão deste mercado, evolui também a tecnologia associada. Os antigos pop-ups sensacionalistas deram lugar a anúncios hiper-personalizados, criados e entregues a grupos muito específicos de utilizadores, um sistema conhecido como "segmentação em redes sociais".

Esta segmentação é possível através da análise de quatro métricas principais:

 

  1. Informações Pessoais: Idade, género, localização, etc.

  2. Interesses: Música ouvida, páginas seguidas, interações com conteúdo.

  3. Comportamento "Fora da App": Websites visitados após interagir com a plataforma (ex: depois de ver um vídeo no YouTube).

  4. Psicografia: Tendências gerais inferidas do comportamento ao longo do tempo, como valores sociais e hábitos de vida.

 

"Careless People": O livro que expõe as práticas da Meta

 

Um livro recente da autoria de Sarah Wynn-Williams, ex-funcionária do Facebook (agora Meta), intitulado "Careless People", está a lançar luz sobre as práticas alegadamente preocupantes da gigante tecnológica no que toca à segmentação publicitária. Wynn-Williams trabalhou na empresa entre 2011 e 2017, chegando a diretora de políticas públicas.

 

Segundo a autora, já em 2017, o Facebook explorava formas de expandir as suas capacidades de segmentação publicitária para adolescentes entre os 13 e os 17 anos, tanto no Facebook como no Instagram. Este grupo é considerado particularmente vulnerável, frequentemente a lidar com questões de imagem e crises sociais típicas da adolescência.

 

Explorando a vulnerabilidade psicológica

 

Embora os algoritmos publicitários da Meta sejam notoriamente opacos, Wynn-Williams alega que a empresa criou uma apresentação para anunciantes onde se vangloriava da sua capacidade de explorar "momentos de vulnerabilidade psicológica" nos seus utilizadores. Isto seria feito através da segmentação de termos de pesquisa e interações associadas a sentimentos como "inútil", "inseguro", "stressado", "derrotado", "ansioso", "estúpido" e "fracassado".

O livro detalha outras práticas alegadas, como:

 

  • Monitorizar quando raparigas adolescentes apagavam selfies, para lhes apresentar anúncios de produtos de beleza nesse preciso momento.

  • Segmentar jovens mães com base no seu estado emocional.

  • Criar índices emocionais mapeados a grupos raciais específicos, como um "Índice de Sentimento Fantástico Superior para Hispânicos e Afro-Americanos".

 

Wynn-Williams reflete: "Para mim, este tipo de vigilância e monetização do sentimento de inutilidade de jovens adolescentes parece um passo concreto em direção ao futuro distópico sobre o qual os críticos do Facebook há muito alertavam."

 

A resposta da empresa e a continuação das práticas

 

Quando estas alegações surgiram pela primeira vez em 2017, a autora descreve a reação dos executivos responsáveis como de indiferença. A empresa emitiu um comunicado genérico, afirmando levar a situação "muito a sério" e estar a "tomar todas as medidas para remediar a situação". Uma investigadora júnior foi despedida, servindo, nas palavras de Wynn-Williams, como "bode expiatório".

 

No entanto, o trabalho neste tipo de segmentação publicitária alegadamente continuou. A autora escreve que o vice-diretor de privacidade da altura confirmou que "não só o Facebook oferece este tipo de segmentação comportamental personalizada", como também "existe uma equipa de produto a trabalhar numa ferramenta que permitiria aos anunciantes fazerem isto sozinhos, sem a ajuda do Facebook".

 

Wynn-Williams relata ainda a frustração dos seus superiores perante a ideia de que haveria algum problema em segmentar jovens vulneráveis. Um dos principais executivos de publicidade terá dito: "Isto é o negócio, Sarah. Temos orgulho nisto. (...) É isto que põe dinheiro nos nossos bolsos. E estas declarações fazem parecer que é algo nefasto."

 

(A Meta intentou uma ação legal contra o livro, forçando Wynn-Williams a parar a sua promoção, o que não impediu que se tornasse um bestseller.)

 

A era do capitalismo de vigilância continua a revelar aspetos preocupantes, com investigadores e jornalistas a trabalhar para os expor. A monetização do desespero e da insegurança parece ser um dos exemplos mais inquietantes, personificando as críticas feitas a este modelo desde o seu início. Como escreveu o filósofo Antonio Gramsci: "O velho mundo está a morrer e o novo mundo luta para nascer. Agora é o tempo dos monstros."




Aplicações do TugaTechAplicações TugaTechDiscord do TugaTechDiscord do TugaTechRSS TugaTechRSS do TugaTechSpeedtest TugaTechSpeedtest TugatechHost TugaTechHost TugaTech