
Uma transformação silenciosa, mas massiva, está a ocorrer nas universidades. Os estudantes descobriram uma forma radicalmente mais eficiente de absorver conhecimento complexo: em vez de lerem os manuais, conversam com eles através de Inteligência Artificial. O fenómeno, que já tem nome, levanta questões profundas sobre o futuro da aprendizagem e do pensamento crítico.
A discussão ganhou tração a partir de uma publicação de @alz_zyd_ na rede social X, onde um professor universitário partilhou uma observação surpreendente: "Passar uma hora a fazer perguntas ao ChatGPT sobre Adam Smith geralmente ensina o triplo do que passar uma hora a ler 'A Riqueza das Nações'". Segundo ele, a eficiência é esmagadora.
Esta perceção foi reforçada pelo comentário de Doug Henwood, que deu o alarme: "Entrámos de cabeça na pós-alfabetização e isto é verdadeiramente alarmante".
O novo método de "leitura"
Aparentemente, inúmeros estudantes estão a adotar esta prática de forma discreta, um facto que começa a ser validado por vários estudos académicos. Para eles, não se trata de preguiça, mas de um método simplesmente superior para processar informação densa. O processo é metodológico e eficaz:
Carregam o PDF do livro ou manual para a plataforma de IA.
Pedem um resumo das ideias principais.
Fazem perguntas específicas sobre conceitos que não entenderam.
Pedem clarificações e analogias para facilitar a compreensão.
Solicitam exemplos contemporâneos para aplicar a teoria.
O resultado é a capacidade de compreender os fundamentos de matérias complexas, como a economia, numa fração do tempo que a leitura tradicional exigiria.
Pós-alfabetização: a era do cérebro em modo GPS
O termo "pós-alfabetização", cunhado por Henwood, descreve esta mutação cognitiva. A capacidade de ler não desaparece, mas a digestão intelectual, o processo de mastigar e assimilar a informação, é externalizada para um algoritmo.
A analogia com o GPS é perfeita. Há quinze anos, já se debatia como a tecnologia de navegação estava a atrofiar o nosso sentido de orientação inato. Hoje, delegamos na IA uma função cerebral ainda mais fundamental: a interpretação e a construção de conhecimento. A leitura profunda exige resistência mental, paciência para a ambiguidade e uma construção gradual de critério. Em contrapartida, o ChatGPT oferece clareza instantânea e sínteses imediatas.
A troca cognitiva: velocidade contra profundidade
A geração que cresce com esta ferramenta irá, inevitavelmente, desenvolver um conjunto diferente de habilidades cognitivas. Por um lado, poderá exibir uma maior velocidade de processamento, uma capacidade de síntese mais apurada e talvez uma maior facilidade em estabelecer conexões conceptuais abrangentes.
Por outro lado, o risco é uma enorme dependência do intermediário algorítmico. Quando toda a informação já chega pré-processada, o "músculo" do pensamento crítico arrisca-se a atrofiar. Surge a preocupação de estarmos a formar uma geração brilhante à superfície, capaz de articular qualquer conceito de forma rápida, mas vulnerável na profundidade, incapaz de detetar nuances, falácias ou de construir um argumento original sem assistência.
A era da pós-alfabetização parece inevitável e, muito provavelmente, irreversível. Quem dominar ambos os modos – a leitura tradicional e profunda, aliada ao diálogo eficiente com a IA – terá uma vantagem competitiva clara. Os restantes arriscam-se a ficar presos na sua própria eficiência, rápidos a responder, mas frágeis a pensar.