
A Google está a preparar uma mudança fundamental na forma como as aplicações são instaladas no Android, que promete impactar programadores e utilizadores que preferem obter software fora da Play Store. Numa série de comunicações recentes, a empresa detalhou um novo sistema de verificação obrigatória para programadores, justificando a medida com a necessidade de aumentar a segurança do ecossistema. No entanto, a comunidade tecnológica encara a novidade com ceticismo, vendo-a como mais um passo da gigante para controlar e monetizar a plataforma.
A empresa garante que a instalação de aplicações fora da loja oficial, ou ‘sideloading’, não vai desaparecer. No entanto, o processo está prestes a tornar-se consideravelmente mais complicado e, em muitos casos, pago.
Como vai funcionar a nova verificação?
A peça central desta mudança é um novo componente de sistema chamado Android Developer Verifier, que será implementado com a chegada do Android 16. Na prática, para que uma aplicação possa ser instalada, o telemóvel terá de confirmar que o nome do pacote e as chaves de assinatura foram previamente registados junto da Google. Esta alteração poderá quebrar o funcionamento de lojas de aplicações alternativas e de código aberto, como a popular F-Droid.
Como seria impraticável para um dispositivo armazenar uma base de dados com todas as aplicações verificadas, o processo irá exigir uma ligação à internet na maioria dos casos. A Google planeia manter uma cache local com as aplicações mais comuns, mas para tudo o resto, a verificação terá de ser feita online. Existem planos para permitir que lojas de apps alternativas usem um token de pré-autenticação para evitar estas chamadas à rede, mas os detalhes ainda não foram finalizados.
Pagar para ser livre? Os novos custos para os programadores
A alteração mais controversa é, sem dúvida, a introdução de uma taxa. O processo de verificação terá um custo para os programadores semelhante à taxa de registo atual da Google Play, fixada em 25 dólares (cerca de 23 euros). Isto significa que qualquer pessoa que queira distribuir uma aplicação para Android, mesmo que gratuitamente e fora do ecossistema da Google, terá de pagar à empresa por esse privilégio.
A única exceção a esta regra será um nível de verificação mais baixo, destinado a estudantes e entusiastas. Este registo "hobbyist" será gratuito, necessitando apenas de um email, mas terá um limite, ainda por clarificar, no número de vezes que as suas aplicações poderão ser instaladas.
A caça ao malware (e o que mais vier à rede)
Oficialmente, a Google afirma que este sistema de verificação não irá avaliar o conteúdo das aplicações, focando-se apenas em detetar software malicioso que represente "um elevado grau de dano". A empresa assegura que não irá aplicar todas as outras regras restritivas da Play Store.
Ainda assim, a comunidade está de pé atrás. Muitos temem que a Google possa, no futuro, reinterpretar as suas próprias regras para bloquear aplicações que não lhe agradam, como bloqueadores de publicidade ou clientes alternativos como o YouTube ReVanced. A gigante tecnológica tem um historial de agrupar software que considera inconveniente na mesma categoria de malware, como aconteceu recentemente com extensões do Chrome que bloqueavam anúncios de forma eficaz.
A falta de confiança: porque é que a comunidade está de pé atrás?
O ceticismo não surge do nada. A Google foi recentemente considerada culpada em tribunal por práticas ilegais para manter o monopólio da Play Store, agindo contra os interesses de programadores e utilizadores. Agora, numa altura em que as lojas de apps alternativas poderiam finalmente ganhar tração, a empresa decide que a segurança do sideloading é um problema urgente que só ela pode resolver, colocando-se no controlo de todo o processo.
Outra grande preocupação é a privacidade. Os programadores mostram-se receosos em fornecer os seus dados pessoais à Google. A empresa já confirmou que, embora não vá criar uma lista pública de programadores de sideload, terá essa informação na sua posse. Isto significa que a Google terá a informação, que poderá ser exigida por autoridades governamentais, levantando questões sobre potencial censura, como já aconteceu com a remoção de certas apps na App Store da Apple a pedido de governos. Mesmo sem verificação, o Android já possui várias salvaguardas, como o Play Protect, que analisa todas as apps no dispositivo. Para muitos, esta nova camada de controlo parece mais uma tentativa de proteger o seu lucrativo negócio do que propriamente os utilizadores.