
Se é um entusiasta do mundo automóvel, é provável que já tenha ouvido os rumores. A Comissão Europeia abriu uma brecha naquilo que parecia ser uma sentença de morte definitiva: a proposta para manter os carros com motores de combustão vivos após 2035. Embora nada esteja ainda "gravado na pedra" — a proposta necessita de aprovação do Parlamento Europeu e dos Estados-membros — a direção do vento mudou.
Esta possível alteração legislativa, que surge num momento em que a UE recua nos planos e os motores de combustão escapam à proibição total em 2035, tem sido apelidada por alguns analistas de "emenda Porsche". A ideia é que marcas de luxo e alta performance possam continuar a utilizar a combustão, desde que cumpram critérios rigorosos de emissões (fala-se em médias de frota extremamente baixas ou uso de combustíveis sintéticos). Mas, felizmente, esta porta entreaberta não serve apenas para salvar o Porsche 911 ou os V12 da Ferrari; pode ser a salvação de um conceito mais "acessível" e tecnologicamente fascinante da Mazda.
O regresso do motor rotativo como gerador
A maioria dos desportivos do futuro será, inevitavelmente, elétrica. No entanto, se esta nova regulação for aprovada, cria-se um espaço vital para os veículos elétricos de autonomia estendida (EREV). É aqui que entra a visão da Mazda, que quer manter viva a chama da condução desportiva sem o peso excessivo das baterias gigantes.
Em novembro de 2023, no Salão Automóvel de Tóquio, a marca japonesa revelou o Mazda Iconic SP. Este protótipo, com um design que funde as linhas do lendário MX-5 com o icónico RX-7 (incluindo os faróis escamoteáveis), não é um elétrico puro. Trata-se de um híbrido onde as rodas são movidas exclusivamente por motores elétricos, mas que conta com um motor rotativo compacto para gerar eletricidade e carregar a bateria.

Esta configuração permite manter o peso do veículo nuns impressionantes 1.430 kg — um valor muito baixo para os padrões atuais dos elétricos — e oferecer cerca de 370 cv de potência. É a filosofia da Mazda em estado puro: a tecnologia deve servir o prazer de condução, não apenas os números numa folha de especificações.
Viabilidade técnica contra a realidade do mercado
Masahi Nakayama, o responsável pelo design deste desportivo, admitiu recentemente que o Iconic SP é "o carro dos seus sonhos" e que a sua produção é "tecnicamente viável". O grande obstáculo, como sempre, são os custos. Para um fabricante de dimensão mais reduzida como a Mazda, lançar um veículo de nicho é um risco financeiro enorme, especialmente se o seu tempo de vida comercial fosse cortado abruptamente em 2035.
O mercado europeu é crucial para a viabilidade deste projeto. Enquanto na China os consumidores procuram outro tipo de experiências tecnológicas e nos EUA a adoção de elétricos compactos é lenta, a Europa (e o Japão) seriam os palcos naturais para este desportivo. Se a proibição total avançasse, o investimento não se justificaria.
Contudo, com a nova proposta da Comissão Europeia, o cenário muda. Sendo um carro de nicho com vendas limitadas, seria mais fácil para a Mazda compensar as suas emissões residuais com o resto da frota ou através de créditos de carbono, permitindo que o motor rotativo continue a "cantar", mesmo que apenas como gerador.
A incerteza regulatória dos próximos anos será decisiva. A Mazda enfrenta desafios na Europa, onde a sua gama atual terá de se adaptar rapidamente para cumprir as metas de 2027. Mas esta "emenda" na lei europeia pode ser exatamente o que os fãs precisavam para que o Iconic SP deixe de ser apenas um protótipo de salão e passe a ser uma realidade nas estradas, quebrando a monotonia de um mercado automóvel cada vez mais estandardizado.