
Uma equipa de cientistas do Instituto de Ciência de Tóquio, liderada pelo Professor Pham Nam Hai, desenvolveu um semicondutor ferromagnético (FMS) que funciona a temperaturas mais elevadas do que qualquer outro material semelhante alguma vez registado. De acordo com as suas descobertas, publicadas na revista Applied Physics Letters, o material atinge uma temperatura Curie de até 530 K, o equivalente a cerca de 257 °C, um valor muito superior à temperatura ambiente.
O que é a spintrónica e porque é tão importante?
Para quem não está familiarizado, a spintrónica é uma tecnologia emergente que promete revolucionar a eletrónica como a conhecemos. Em vez de usar apenas a carga dos eletrões (como a eletrónica tradicional), a spintrónica utiliza também o seu "spin", uma propriedade quântica relacionada com o seu momento magnético.
Esta abordagem abre portas a dispositivos com um consumo de energia muito baixo, praticamente sem perdas em modo de espera (standby), uma durabilidade fantástica e um desempenho de leitura e escrita excecional. Tudo isto num formato não volátil, o que significa que os dados são mantidos mesmo sem energia. A memória MRAM (Magnetoresistive RAM), baseada nesta tecnologia, é vista como uma forte candidata a tornar-se a "memória universal" do futuro, integrando-se facilmente nos circuitos CMOS atuais.
O desafio de operar à temperatura ambiente
O grande obstáculo para a spintrónica tem sido o desenvolvimento de materiais que mantenham as suas propriedades magnéticas a temperaturas de funcionamento normais. A temperatura Curie é o ponto crítico em que um material ferromagnético perde o seu magnetismo permanente. Tentativas anteriores, como os semicondutores (Ga,Mn)As, apresentavam temperaturas Curie baixas, tornando-os pouco práticos. Mesmo avanços que atingiram os 420 K (cerca de 147 °C) não eram suficientes para uma operação estável no mundo real.
A dificuldade reside em incorporar uma grande quantidade de elementos magnéticos, como o ferro, na estrutura cristalina do semicondutor sem a danificar.
A solução inovadora de Tóquio
A equipa do Professor Hai encontrou uma forma de contornar este problema. Utilizando uma técnica de crescimento avançada, conseguiram criar películas finas de (Ga,Fe)Sb com uma concentração de ferro de até 24%, sem comprometer a integridade do material. Este método permitiu-lhes criar filmes com temperaturas Curie entre 470 K (197 °C) e 530 K (257 °C), as mais altas alguma vez reportadas na investigação de semicondutores ferromagnéticos.
"Nos materiais convencionais de (Ga,Fe)Sb, manter a cristalinidade com altos níveis de ferro era um problema persistente. Ao aplicar a nossa nova técnica de crescimento, conseguimos resolver este desafio e alcançar a temperatura Curie mais alta do mundo em FMSs", afirmou o Professor Hai.
Um material robusto e promissor
Para confirmar o comportamento magnético, os cientistas utilizaram várias técnicas de análise, que validaram as propriedades do material. O momento magnético de cada átomo de ferro medido foi de aproximadamente 4,5 μB, um valor próximo do ideal teórico e quase o dobro do momento magnético do ferro metálico comum.
A durabilidade do material também foi posta à prova. Uma película fina com apenas 9,8 nm de espessura, armazenada ao ar livre durante um ano e meio, manteve fortes propriedades magnéticas, com a temperatura Curie a descer apenas ligeiramente para os 470 K (197 °C).
"Os nossos resultados demonstram a viabilidade de fabricar FMSs de alta temperatura Curie que são compatíveis com operações à temperatura ambiente, o que é um passo crucial para a concretização de dispositivos de spintrónica", concluiu o Professor Hai. Este trabalho mostra como o controlo rigoroso dos métodos de fabrico pode levar a semicondutores mais práticos e poderosos para a próxima geração de eletrónica.










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