EUA restringem exportação de tecnologia para a China, software de chips na mira
Os Estados Unidos da América (EUA) intensificaram as suas restrições comerciais sobre a China, ordenando a um vasto conjunto de empresas que cessem o envio de mercadorias para o país asiático sem uma licença específica. Fontes familiarizadas com o assunto indicam que licenças previamente concedidas a determinados fornecedores foram também revogadas, numa medida que promete acirrar as tensões entre Washington e Pequim.
Estas novas barreiras parecem visar pontos nevrálgicos da cadeia de abastecimento, com o intuito de impedir que a China obtenha produtos cruciais para setores chave da sua indústria. Nos últimos dias, diversas empresas terão recebido comunicações do Departamento de Comércio dos EUA a informar sobre as novas diretrizes.
Software de design de chips e outros setores na mira das restrições
Entre os produtos afetados encontram-se bens essenciais para a produção de semicondutores, como software de design (EDA - Electronic Design Automation) e produtos químicos. A lista inclui ainda butano e etano, máquinas-ferramenta e equipamento para a aviação.
Particularmente visadas foram as empresas fornecedoras de software EDA. Segundo duas fontes, estas terão sido notificadas na passada sexta-feira sobre a nova exigência de licenciamento para exportar para clientes chineses. O Departamento de Comércio analisará os pedidos de licença caso a caso, o que sugere uma restrição controlada em vez de uma proibição total imediata.
Gigantes do EDA como Cadence e Synopsys notificadas
Empresas de renome no setor de software EDA, como a Cadence, Synopsys e Siemens EDA, estão entre as impactadas. Após a divulgação das notícias, as ações da Cadence registaram uma queda de 10.7%, enquanto as da Synopsys desceram 9.6%. No entanto, ambas recuperaram cerca de 3.5% nas negociações após o fecho do mercado, depois de a Synopsys ter reafirmado as suas previsões de receita para 2025.
Numa comunicação com analistas, Sassine Ghazi, CEO da Synopsys, afirmou que a empresa não tinha recebido qualquer carta ou comunicação do Bureau of Industry and Security (BIS) do Departamento de Comércio, a entidade responsável pela aplicação dos controlos de exportação. A Cadence e a Siemens EDA não comentaram imediatamente a situação.
Departamento de Comércio dos EUA confirma ação rigorosa
O Departamento de Comércio dos EUA confirmou estar a rever as exportações de importância estratégica para a China, salientando que, "em alguns casos, o Comércio suspendeu licenças de exportação existentes ou impôs requisitos de licença adicionais enquanto a revisão está pendente". A Casa Branca não respondeu de imediato a um pedido de comentário sobre estas medidas.
A restrição ao acesso a ferramentas EDA seria um golpe significativo para a indústria chinesa, uma vez que os designers de chips do país dependem fortemente deste tipo de software norte-americano. Em abril, a agência de notícias estatal chinesa Xinhua referiu que a Synopsys, Cadence e Mentor Graphics (da Siemens) controlavam, em conjunto, mais de 70% da quota de mercado na China. Empresas chinesas como a Brite Semiconductor, Zhuhai Jieli e VeriSilicon são conhecidas utilizadoras dos softwares da Synopsys e Cadence.
Ponto de estrangulamento? China poderá acelerar autossuficiência
Apesar da pressão, três fontes da indústria de ferramentas EDA indicaram na quinta-feira que a atividade comercial na China continuava a decorrer normalmente, enquanto as empresas aguardam mais clarificações sobre a implementação das restrições.
Nori Chiou, diretor de investimentos na White Oak Capital Partners, sediada em Singapura, considera que "esta é outra medida ineficaz que apenas ajudará a China a avançar na sua autossuficiência, tal como aconteceu com os semicondutores". Chiou acrescentou que existem muitas versões pirateadas destas ferramentas de design, de fácil obtenção, e que o bloqueio dos canais legítimos poderá beneficiar as empresas chinesas de EDA.
Alternativas domésticas às ferramentas das empresas norte-americanas incluem a Empyrean Technology e a Primarius Technologies, cujas ações subiram 17% e 20%, respetivamente, após as notícias. Recorde-se que, em 2023, a Huawei anunciou ter desenvolvido as suas próprias ferramentas EDA para designs de chips passíveis de serem produzidos com tecnologia de 14 nanómetros ou mais avançada, depois de ter sido bloqueada de aceder a fornecedores norte-americanos em 2019.
Um antigo funcionário do Departamento de Comércio descreveu as ferramentas EDA como o "verdadeiro ponto de estrangulamento", acrescentando que regras para restringir a sua exportação para a China já tinham sido consideradas durante a primeira administração Trump, mas foram na altura descartadas por serem vistas como demasiado agressivas.
Impacto financeiro e ecos de políticas anteriores
Qualquer movimento para privar os fabricantes de software dos seus clientes chineses poderá representar um revés financeiro considerável. A China representa cerca de 16% da receita anual da Synopsys e aproximadamente 12% para a Cadence. A Synopsys, que colabora com gigantes como a Nvidia, Qualcomm e Intel, fornece software e hardware utilizados no design de processadores avançados.
A notícia surge depois de o Financial Times ter reportado anteriormente que a administração Trump tinha ordenado às empresas de software que parassem de vender os seus serviços a grupos chineses.
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