
A corrida desenfreada para construir infraestruturas de Inteligência Artificial está a começar a apresentar a fatura ao consumidor comum. O que começou por afetar algumas marcas específicas está agora a alastrar-se, com previsões de que a escassez de componentes poderá ter um impacto severo na indústria de computadores e smartphones já em 2026.
Segundo um novo relatório da International Data Corporation (IDC), no pior cenário possível, as remessas de computadores pessoais poderão encolher até 8,9% em 2026, uma consequência direta dos custos elevados da memória.
O desvio da produção para os servidores
A raiz do problema reside numa mudança estratégica dos fabricantes de componentes. Em vez de expandirem a produção de memória convencional (DRAM e NAND), usada na grande maioria dos portáteis, desktops e telemóveis, as grandes fabricantes estão a canalizar os seus recursos para memórias específicas para centros de dados de IA.
Estamos a falar de tecnologias como a memória de grande largura de banda (HBM) e DDR5 de alta capacidade, essenciais para treinar e executar os modelos de IA que hoje dominam as manchetes. Esta mudança de foco criou um "efeito de funil", reduzindo a disponibilidade da memória RAM tradicional para os fabricantes de PCs, o que, inevitavelmente, obriga ao aumento dos preços para manter as margens de lucro.
Um exemplo prático desta tendência já se fez sentir. A fabricante de computadores modulares Framework já teve de aumentar os preços de alguns dos seus portáteis e componentes, alertando que novos aumentos de custos são "altamente prováveis" nos próximos meses.
A ironia dos "AI PCs" e o impacto nos preços
A situação carrega uma ironia cruel para a indústria. Os chamados "AI PCs" — computadores equipados com unidades de processamento neural (NPU) capazes de correr modelos de IA localmente — eram vistos como a grande esperança para tirar o mercado da sua estagnação pós-pandemia. No entanto, estes mesmos computadores exigem quantidades superiores de memória RAM para funcionarem eficazmente, tornando-os nas vítimas principais desta escassez que a própria indústria da IA criou.

De acordo com as projeções pessimistas da IDC, os preços dos computadores poderão subir entre 6% a 8% em 2026. Para o consumidor, isto significa pagar mais por máquinas que, em alguns casos, poderão nem sequer trazer grandes saltos de desempenho fora das tarefas de inteligência artificial.
Smartphones também não escapam
O impacto não se restringe aos computadores. O relatório da IDC aponta também para um cenário sombrio no mercado móvel. Prevê-se que o preço médio de venda de um smartphone possa crescer na mesma ordem dos 6% a 8%, com uma consequente contração nas remessas de dispositivos que pode chegar aos 5,2%.
No entanto, nem todas as empresas estão no mesmo barco. Gigantes como a Apple e a Samsung, que possuem enormes reservas de dinheiro e acordos de fornecimento de longo prazo (ou, no caso da Samsung, fabricam a sua própria memória), deverão conseguir resistir a esta tempestade e manter a consistência durante um ou dois anos. Para o resto do mercado, o futuro próximo avizinha-se consideravelmente mais caro e com menos margem para aventuras ou riscos.